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O Julho branco: mês do combate ao uso de drogas por crianças e adolescentes

A data foi criada para conscientizar a população sobre o grave problema do abuso de substâncias psicotrópicas, que cada vez mais avança na sociedade.

Na data de 07 de dezembro de 1987, a Organização das Nações Unidas (ONU) instituiu 26 de junho, como o Dia Internacional de Combate às Drogas, por meio da Resolução 42/112. A data foi criada para conscientizar a população sobre o grave problema do abuso de substâncias psicotrópicas, que cada vez mais avança na sociedade. O movimento busca enfatizar a necessidade de se combater os reflexos sociais criados pelas drogas ilícitas, além de planejar ações para o enfrentamento à dependência química e ao tráfico de drogas.

No Estado do Pará, a Lei nº 5.992 de 30 de agosto 1996[1], alterada pela Lei n.º 6.117/98, instituiu a "Semana Paraense de Prevenção e Combate ao Uso de Drogas", no período de 20 a 26 de junho de cada ano.

Outrossim, em compasso com o direcionamento da Organização Internacional, a Sociedade de Pediatria de São Paulo designou o “Julho Branco”, voltado à mobilização do Estado, da família e da sociedade em prol do combate ao uso de substâncias psicoativas por crianças e adolescente.

O uso e abuso de álcool e outras drogas representam um dos problemas mais severos de saúde pública atualmente e, as consequências são extremamente prejudiciais ao organismo do usuário, além de impactar nos vínculos familiares, sociais, trabalhistas, escolares, sobrecarregando o sistema de saúde e assistência social. Quando se trata de adolescentes, as consequências são ainda mais nefastas pois, afetam o indivíduo em sua fase de formação, tanto neurocerebral, quanto em termos de desenvolvimento psicossocial exigindo, portanto, um olhar mais atento da família, da sociedade e do Estado, motivo pelo qual, qualquer utilização de substâncias psicotrópicas, lícitas ou ilícitas, pela população infantojuvenil é considerada abuso e não uso, pelas entidades médicas mundias, para tanto vide OMS, DSM-IV, DSM-III, CID-10, APA, entre outros.

Cumpre destacar, ainda, que a utilização de substancias psicotóxicas por crianças e adolescentes, seja esta lícita ou não, já caracteriza o uso abusivo pois, conforme desmostrado acima, o estágio de desenvolvimento em que se encontram, já ensejam os efeitos nocivos.

Face ao volume de demandas que o Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude (CAOIJ) recebe relacionado com à temática, assim como diante de urgência para a tomada de medidas Institucionais com vistas ao enfrentamento e combate ao problema, foi criado o presente texto jurídico buscando consolidar as principais informações sobre o tema, a fim de fomentar a discussão com a rede de proteção à criança e ao adolescente, bem como subsidiar a atuação ministerial.

A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E A PROTEÇÃO INTEGRAL

Com a Constituição Federal de 1988 (CF/88)[2], o Brasil passou a ter outro olhar para com a infância e a juventude, reconhecendo a criança e o adolescente como sujeitos de direitos:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao Jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL,1988).

De acordo com Di Mauro (2017, p. 46)[3] “foi a Constituição Federal de 1988 que, inovando em relação às demais constituições que já vigoraram em território nacional, abordou princípios voltados à proteção da criança e do adolescente”.

De acordo com o referido mandamento constitucional, a defesa dos direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes e dos jovens é regido pelo Princípio da Cooperação, sendo dever de todos, sociedade, Estado e família, a responsabilidade de garantir e zelar pelo público infantojuvenil, de forma integral, sendo o direito à saúde, ínsito ao direito à vida, cabendo, principalmente aos pais, o dever de cuidar do bem-estar físico e mental dos filhos.

Considerando a evidente expansão do consumo de drogas psicoativas no país, associado a um contexto de vulnerabilidade de crianças e adolescentes, bem como pelo fato de que as referidas substâncias causam danos ainda mais significativos em pessoas em fase de desenvolvimento, aumentando o risco de dependência, faz-se necessário descentralizar, intensificar, ampliar e diversificar as ações da rede de saúde mental orientadas para a prevenção de agravos, promoção da saúde, tratamento e reinserção social da população infantojuvenil envolvida com o abuso de substâncias psicotrópicas.

DO DIREITO A SAÚDE

Diretamente relacionado com o direito à vida, com a garantia da proteção integral e da prioridade absoluta, a CF/88 também de forma expressa traz o direito à saúde, como um direito fundamental. O artigo 196 dispõe que:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação.

De acordo com o artigo 7º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)[4]:

A criança e o adolescente têm direito à proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência

Este que deve ser garantido com prioridade pela família, pela comunidade, pela sociedade em geral e pelo poder público, tendo primazia para receber proteção e socorro em qualquer circunstância.

O abuso de álcool e outras drogas por crianças e adolescentes requer um acompanhamento interdisciplinar, multiprofissional, em conjunto com o paciente, a família e a equipe técnica, devendo abarcar não apenas o tratamento direcionado ao consumo, além de todo o apoio psiquiátrico que a doença requer, bem como, o ambiente que a criança está exposta e em que tenha sido introduzida precocemente no mundo das drogas.

No cuidado à saúde da criança e do adolescente, deve-se levar em conta as suas necessidades essenciais e a identificação das situações vulneráveis frente às condições adversas para o seu desenvolvimento, bem como as fragilidades para proteção e defesa de seus direitos, razão pela qual, as consequências pelo uso das substâncias são mais severas ainda.

O Sistema de Garantias do ECA prevê que o direito à saúde deve ser garantido de forma integral pelo SUS. no art. 11:

Art. 11. É assegurado acesso integral às linhas de cuidado voltadas à saúde da criança e do adolescente, por intermédio do Sistema Único de Saúde, observado o princípio da equidade no acesso a ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde

A PREVENÇÃO AO ABUSO DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS PELA POPULAÇÃO INFANTOJUVENIL

A principal frente de atuação para evitar o envolvimento de crianças e adolescentes com as drogas, é através da prevenção, por meio de ações que busquem informar sobre os malefícios ao consumo, bem como, que visem evitar o primeiro contato entre os jovens, que mostrem de forma clara as consequências que esse tipo de substância causa no organismo, inclusive, sobre a dependência, que em determinadas drogas, pode ser adquirida no primeiro contato, conforme predisposição de cada organismo, a teor da publicação do Hospital Santa Mônica[5].

As ações preventivas devem ser planejadas e direcionadas para o desenvolvimento humano, o incentivo à educação, à prática de esportes, à cultura, ao lazer e a disseminação do conhecimento sobre drogas, com embasamento científico.

A responsabilidade por este processo preventivo é de todos, inclusive, das instituições de ensino, o art. 53-A do ECA é expresso ao determinar que “é dever da instituição de ensino, clubes e agremiações recreativas e de estabelecimentos congêneres assegurar medidas de conscientização, prevenção e enfrentamento ao uso ou dependência de drogas ilícitas”.

A promoção da saúde, de campanhas educativas, orientadoras, é o caminho mais eficiente para que se possa minimizar ou retardar o uso de drogas pelos jovens. A construção da cidadania, por meio do compartilhamento de conhecimento na sociedade, viabiliza chances de melhores condições de um projeto de vida longe de substancias psicotrópicas ilícitas.

O próprio Ministério Público tem realizado campanhas de conscientização alusivas ao maléfico do uso do álcool e outras drogas, buscando educar a comunidade em geral e alertar os comerciantes sobre a responsabilização por comercialização de substâncias psicoativas, ainda que lícitas, para menores de 18 anos[6].

A DEPENDÊNCIA QUÍMICA

A dependência química é tipificada como um transtorno mental, com reflexos físicos, psicológicas e emocionais que interferem diretamente na qualidade de vida do usuário, atingindo vínculos familiares, o convívio social saudável, resultando frequentemente na perda do rendimento e no abandono escolar.

Para sair do vício, são necessários esforços conjuntos, entre todos os envolvidos e acompanhamento sério e constante da Rede de Atendimento, uma vez que o dependente torna-se refém da própria condição, tendo em vista que mesmo tendo noção dos efeitos negativos que o consumo produz em sua vida, não consegue interromper o ciclo, sendo necessária a ajuda profissional e tratamento especializado.

A ADOLESCÊNCIA: FATOR DE VULNERABILIDADE

A adolescência é uma etapa de vida de maior fragilidade, com maior incidência de comportamentos de risco, como: autoestima rebaixada, insegurança no processo de tomada de decisão, transformações corporais rápidas e acentuadas, dificuldade para lidar com conflitos familiares e violência, fracasso ou exclusão escolar, não clareza das regras usadas pelos pais e professores, que propiciam o contato experimental com a droga, principalmente, pela falsa sensação de controle e do desprezo com os efeitos que podem ser causados.

Há uma relação muito próxima entre a dependência química e a adolescência, em razão de múltiplos fatores, como por exemplo, a busca dos jovens por pertencimento, desejo de fuga da realidade em que estão inseridos, má influência de amigos, reprodução de comportamentos de seus familiares, desejo de pertencimento a grupos onde o uso de substâncias psicoativas demonstra poder, ou critério de aceitação, dentre outros.

Os adolescentes inseridos em um contexto de violações de direitos, com pais e familiares adictos, tendem a normalizar o consumo de substâncias psicoativas e, por diversas vezes, buscam através da droga, escapar da cruel realidade que vivenciam, das condições em que são expostos e da falta de suporte, seja por parte da família, do Estado ou da sociedade.

Instituiu-se uma banalização das drogas, utilizadas de forma desenfreada como combustível de festas, reuniões entre jovens regadas de alucinógenos, a falsa percepção de controle, as diferentes predisposições de cada organismo, bem como, o contexto psicológico de quem experimente, empurra todos os dias para a dependência química.

Cumpre destacar, outrossim, a extrema facilidade de acesso as drogas, que via de regra, são iniciadas com o uso do cigarro e do álcool, que apesar de legalizadas, também são substâncias prejudiciais ao desenvolvimento físico e psíquico de seus usuários, especialmente, crianças e adolescentes e servem muitas vezes de trampolim para o consumo de substâncias psicoativas mais pesados.

AS DROGAS PSICOATIVAS E SUA CLASSIFICAÇÃO

Procuraremos registrar e classificar apenas uma pequena porção das drogas: as psicotrópicas ou psicoativas, isto é, aquelas que agem alterando o funcionamento do cérebro. Eles podem ser classificadas de diversas formas, segundo diferentes critérios, como, por exemplo, o tipo de alteração farmacológica que efetuam no Sistema Nervoso Central (SNC) (Quadro 1) e no comportamento do usuário; a origem, se naturais ou sintéticas (Quadro 2); o estatuto jurídico, se lícitas ou ilícitas (Quadro 3).

O primeiro grupo reúne as drogas capazes primordialmente de diminuir ou deprimir a atividade do cérebro e que por isso são chamadas de drogas depressoras da atividade do SNC. O protótipo desse tipo de droga é o álcool, mas há também o grupo dos soníferos ou hipnóticos, como os barbitúricos (fenobarbital, fenitoína etc.); o grupo dos ansiolíticos, como os benzodiazepínicos (diazepam, bromazepam, lorazepam etc); os opiáceos ou narcóticos, que aliviam a dor e dão sonolência, como a morfina e seus derivados (heroína, codeína, meperidina etc); e os inalantes ou solventes, como colas, tintas e removedores.

O segundo grupo de drogas psicotrópicas reúne aquelas que atuam aumentando a atividade cerebral, motivo pelo qual recebem a denominação de drogas estimulantes da atividade do SNC. São exemplos de drogas psicotrópicas estimulantes a cocaína, as anfetaminas e derivados (incluindo alguns anorexígenos usados em fórmulas para emagrecimento como a dietilpropriona e o femproporex) e o tabaco.

O terceiro grupo é constituído por drogas que agem modificando a qualidade do funcionamento cerebral. Por essa razão, são denominadas drogas perturbadoras da atividade do SNC. Representam esse grupo as drogas chamadas alucinógenas, como a mescalina (do cacto mexicano), a maconha ou THC (tetrahidrocanabinol), a psilocibina (cogumelos), o lírio (trombeteira, zabumba ou saia branca), o LSD, o ecstasy e os anticolinérgicos.

OS EFEITOS E CONSEQUÊNCIAS DO CONSUMO DE SUBSTÂNCIAS PSICOTRÓPICAS POR CRIANÇAS E ADOLESCENTES

Os efeitos e consequências em decorrência do abuso de substâncias psicoativas em crianças adolescentes, atingem o organismo com um todo, cérebro, fígado, coração, pulmão e, variam conforme o tipo, a frequência e a dose de droga utilizada.

Em razão do estágio de desenvolvimento do adolescente, os efeitos acabam sendo mais tóxicos, afetando diretamente a concentração, atenção e pensamento, refletindo em baixo rendimento escolar, bem como pode resultar em agitação ou cansaço exagerado, sem contar com os sintomas da abstinência que incluem enjoos, vômitos, suor excessivo, batimentos cardíacos acelerados e sentimentos de morte e perseguição.

O TRATAMENTO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES ADICTOS

Quando uma criança ou adolescente torna-se dependente de substâncias psicotrópicas, o Estado deve estar apto a ampará-la, juntamente com seus familiares, para de pronto oferecer tratamento adequado e personalizado, definido por equipe multiprofissional de acompanhamento, através da construção de um projeto terapêutico individualizado, que não se restringe ao tratamento médico, e sim, em relação à saúde mental em perspectiva integral.

É de extrema importância que os responsáveis pela criança ou adolescente dependente, participem diretamente do processo de desintoxicação e reconstrução de vida, a Lei n.º 11.343/2006[7], que instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, prevê que o Plano Individual de Atendimento (PIA) ao usuário ou dependente de drogas, elaborado pela rede de atendimento, deverá:

Art. 23-B, § 3º: O PIA deverá contemplar a participação dos familiares ou responsáveis, os quais têm o dever de contribuir com o processo, sendo esses, no caso de crianças e adolescentes, passíveis de responsabilização civil, administrativa e criminal.

Ou seja, os responsáveis pela criança ou adolescente em tratamento têm o dever de acompanhá-los em todas as etapas, caso assim não o façam, podem ser responsabilizados.

Vale ressaltar que é pacífico que a internação, o atendimento extra-hospitalar e ambulatorial e a utilização de medicamentos não pode ser dissociada das abordagens social e psicoeducacional, com mudanças de comportamentos alimentares, sociais, desportivos, educacionais.

A REDE DE ATENÇÃO INTEGRAL EM SAÚDE MENTAL

Conforme disposto pelo Ministério Público de Goiás, no Manual do Promotor de Justiça da Infância e juventude[8], a rede de atenção integral em saúde mental compreende os serviços destinados a atender as pessoas com necessidades resultantes de transtornos mentais e/ou consumo de álcool e outras drogas, tendo como “porta de entrada da rede” os serviços de atenção básica, os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e os serviços de urgência/emergência.

Após o atendimento inicial, a rede deverá estar apta a dar continuidade no tratamento, ofertando todo os serviços necessários, de modo a garantir a integralidade da atenção à saúde, bem como, quando se tratar de crianças e adolescentes, deverá abranger as áreas da educação e assistência social, a fim de proporcionar ao paciente e seus familiares, tratamento específico e adequado a suas peculiaridades.

Faz-se importante também, que os serviços oferecidos no município sejam ofertados de forma espontânea, sem que se faça necessária a intervenção do conselho tutelar ou do sistema de Justiça, ainda que por meio de pactuações, ou seja, ao paciente que estiver enfrentando problemas com o abuso de substâncias psicoativas, deve ser garantido o acesso direto ao tratamento quando houver interesse, sem que para isso, ele tenha que procurar o conselho tutelar para que aplique as medidas protetivas com os devidos encaminhamentos, bem como, o Sistema de Justiça, que deve ser acionado apenas em casos de negativa de serviço, a Rede deve, por si só, estar apta para enfrentar as referidas situações, com uma estrutura bem definida, completa e eficaz.

AS PACTUAÇÕES E REGIONALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DA REDE

A estruturação dos serviços que devem ser oferecidos no município para implementação e manutenção da rede de atenção integral em saúde mental, tanto pelo município, como pelo Estado, é possível realizá-las através de pactuações entre gestores, visando organizar e integrar as ações e serviços de saúde, conforme art. 2º, II, do Decreto n.º 7.508, de 28 de junho de 2011.[9].

Para que seja possível a regionalização dos serviços, diversos fatores devem ser analisados, como o perfil populacional, a demanda da município e Estado, dados epidemiológicos, real cenário da saúde das áreas envolvidas, estrutura ofertada à população, responsabilidades bem definidas para cada ente, indicadores e metas de saúde, formas de avaliação do desempenho dos serviços, origem dos recursos financeiros e todas as questões técnicas necessárias a garantia da proteção integral a saúde em todas as regiões envolvidas.

Como exemplos de serviços que podem ser regionalizados, cita-se o CAPS, as unidades de acolhimento, os componentes da atenção hospitalar, dentre outros, contudo, a pactuação não pode acarretar prejuízo à sociedade, deve ser elaborada de modo a garantir que o local de atendimento seja acessível e o serviço eficiente, não há de ser negligenciada a integralidade da assistência aos dependestes de substâncias psicoativas.

OS INTEGRANTES DA REDE DE ATENÇÃO INTEGRAL EM SAÚDE MENTAL

A Rede de Atendimento é composta pelos seguintes serviços[10]:

De acordo com a Portaria n.º 2.488, de 21 de outubro de 2011, do Ministério da Saúde[11],

a Atenção Básica engloba um conjunto de ações de saúde, em âmbito individual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, a redução de danos e a manutenção da saúde com o objetivo de desenvolver uma atenção integral que impacte na situação de saúde e autonomia das pessoas e nos determinantes e condicionantes de saúde das coletividades.

A Rede de Atenção básica é composta dos seguintes serviços:

a) Unidades Básicas de Saúde: é um serviço de saúde constituído por equipe multiprofissional responsável por um conjunto de ações de saúde, de âmbito individual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, a redução de danos e a manutenção da saúde com o objetivo de desenvolver a atenção integral que impacte na situação de saúde e autonomia das pessoas e nos determinantes e condicionantes de saúde das coletividades (artigo 6º, I, "a", da Portaria n. 3.088, de 23 de dezembro de 2011, do Ministério da Saúde[12]).

As unidades básicas abrangem as seguintes equipes:

- Unidades e equipes da Estratégia de Saúde da Família (ESF): buscam ofertar um atendimento geral as famílias, o atendimento preventivo, atuando antes do problema em si. As equipes realizam ações de promoção da saúde, de prevenção de agravos e de tratamento, não se restringe a doença em si, mas compreendendo o indivíduo em sua totalidade recuperação e reabilitação de doenças, a partir do acompanhamento continuo com os pacientes e suas famílias e, em se tratando de Saúde Mental, tornam-se articuladoras em conjunto com os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS).

- Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF): fazem parte da atenção básica, mas não se constituem como serviços com unidades físicas independentes ou especiais, e não são de livre acesso para atendimento individual ou coletivo.

[...] São exemplos de ações de apoio desenvolvidas pelos profissionais dos NASF: discussão de casos, atendimento conjunto ou não, interconsulta, construção conjunta de projetos terapêuticos, educação permanente, intervenções no território e na saúde de grupos populacionais e da coletividade, ações intersetoriais, ações de prevenção e promoção da saúde, discussão do processo de trabalho das equipes e etc. (Portaria n. 2.488/2011, do Ministério da Saúde).

Os NASF são compostos por equipes profissionais de diferentes áreas de conhecimento e atuação, que trabalham em parceria com as equipes da Saúde da Família, da Atenção Básica para populações específicas e Academia da Saúde, compartilhando suas expertises nos territórios em que atuam.

Funcionam como uma base de referência e apoio às equipes da ESF, trabalhando em conjunto, com corresponsabilidade, tendo em vista que o paciente quando avaliado pela equipe do NASF, não deixa de ser acompanhado pela equipe da ESF, contudo, não são de livre acesso para atendimento individual ou coletivo, estando vinculados ao processo de trabalho das equipes de atenção básica, conforme as necessidades por elas identificadas durante o atendimento, não são portas de entrada da comunidade.

Em suma, as Unidade de ESF na maioria das vezes é o primeiro contato da criança/ adolescente dependente de substâncias psicoativas com a Rede de Atenção em Saúde Mental, quando obtém êxito, nos casos graves e complexos, recebem o apoio do NASFs e os CAPS, compartilhando as atribuições a fim de garantir um tratamento integral e eficaz.

Para que o serviço seja fornecido de forma adequada, as equipes do ESF, NASFs e CAPS do município devem atuar de forma integrada, estabelecendo vínculos com os pacientes e seus familiares e elaborando projetos terapêuticos individualizados para cada caso concreto, que possam ser acessados e compartilhados por todas as equipes.

b) Equipes dos Consultórios na Rua: constituída por profissionais que atuam de forma itinerante, ofertando ações e cuidados de saúde para a população em situação de rua, considerando suas diferentes necessidades de saúde, sendo responsabilidade dessa equipe, no âmbito da Rede de Atenção Psicossocial, ofertar cuidados em saúde mental, para: 1) pessoas em situação de rua em geral; 2) pessoas com transtornos mentais; 3) usuários de crack, álcool e outras drogas, incluindo ações de redução de danos, em parceria com equipes de outros pontos de atenção da rede de saúde, como Unidades Básicas de Saúde (UBS), CAPS, Prontos-Socorros, entre outros (artigo 6º, I, "b", da Portaria n. 3.088, de 23 de dezembro de 2011, do Ministério da Saúde).

Os Consultórios na Rua atuam no contexto dos indivíduos, adaptados para a população em situação de rua, que não tem acesso aos serviços da rede tradicionais elencados acima, atendem através de equipes volantes multidisciplinares, formadas, geralmente, por enfermeiro, psicólogo, assistente social, terapeuta ocupacional, médico, agente social, técnico/auxiliar de enfermagem e técnico em saúde bucal.

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS)

  • Os CAPS são serviços de saúde de caráter aberto e comunitário, voltados aos atendimentos de pessoas com sofrimento psíquico ou transtorno mental, incluindo aquelas com necessidades decorrentes do uso de álcool, crack e outras substâncias psicotrópicas, seja em situações de crise ou em processos de reabilitação psicossocial.
  • Os Centros são compostos por multiprofissionais, que desenvolvem diferentes intervenções e estratégias de acolhimento, como psicoterapia, seguimento clínico em psiquiatria, terapia ocupacional, reabilitação neuropsicológica, oficinas terapêuticas, medicação assistida, atendimentos familiares e domiciliares, entre outros.
  • O objetivo dos CAPS é atender as pessoas com transtorno mental severo e persistente, bem como, seus familiares, através de equipes profissionais habilitadas para prestar o cuidado em atenção psicossocial, buscando garantir a cidadania do paciente, o tratamento adequado e a restauração de seus vínculos sociais.
  • O Caps I: Atendimento a todas as faixas etárias, para transtornos mentais graves e persistentes, inclusive pelo uso de substâncias psicoativas; atende cidades e ou regiões com pelo menos 15 mil habitantes.

Modalidades de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS)

  • Caps I: Atende pessoas de todas as faixas etárias que apresentam prioritariamente intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e persistentes, incluindo aqueles relacionados ao uso de substâncias psicoativas, e outras situações clínicas que impossibilitem estabelecer laços sociais e realizar projetos de vida. Indicado para municípios ou regiões de saúde com população acima de quinze mil habitantes.
  • Caps II: Atendimento a todas as faixas etárias, para transtornos mentais graves e persistentes, inclusive pelo uso de substâncias psicoativas; atende cidades e ou regiões com pelo menos 70 mil habitantes.
  • Caps AD: Álcool e Drogas: Atendimento a todas faixas etárias, especializado em transtornos pelo uso de álcool e outras drogas, atende cidades e ou regiões com pelo menos 70 mil habitantes.
  • Caps III: Atendimento com até 5 vagas de acolhimento noturno e observação; todas faixas etárias; transtornos mentais graves e persistentes inclusive pelo uso de substâncias psicoativas; atende cidades e ou regiões com pelo menos 150 mil habitantes.
  • Caps AD III: Álcool e Drogas: Atendimento com 8 a 12 vagas de acolhimento noturno e observação; funcionamento 24h; para todas as faixas etárias; realizando atenção contínua às pessoas com necessidades relacionadas ao uso de drogas psicoativas, incluindo atendimentos individuais, atividades de reabilitação psicossocial, intervenções em situações de crise, como recaída e abstinência, e/ou de desintoxicação.

A permanência de um mesmo paciente no acolhimento noturno do CAPS AD III fica limitada a 14 (catorze) dias, no período de 30 (trinta) dias. "Caso necessária permanência superior a 14 (catorze) dias, este deverá ser encaminhado a uma Unidade de Acolhimento, conforme redação do § 2º” (artigo 6º, inciso X, § 1º, da Portaria n. 130, de 26 de janeiro de 2012)[15].

O Ministério da Saúde não determinou qual CAPS possui atribuição exclusiva para atendimento de crianças e adolescentes com transtornos mentais decorrentes do uso de drogas psicoativas, atribuindo responsabilidade tanto aos CAPS AD, quanto aos CAPS I, de acordo com artigo 7º (§4º, IV a VI) da Portaria n. 3.088, de 23/12/2011.

O atendimento ao público infantojuvenil pode ser realizado pelo CAPS AD e, pelo CAPS I, sendo ideal que cada município defina o fluxo mais adequado às suas necessidades, tendo em vista que o perfil populacional dos municípios é um dos critérios para a definição dos tipos de Centros de Atenção Psicossocial a serem implantados, lembrando, que a oferta do serviço pode ser regionalizada, conforme explicitado anteriormente.

Caps AD IV: Atendimento a pessoas com quadros graves e intenso sofrimento decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas. Sua implantação deve ser planejada junto a cenas de uso em municípios com mais de 500.000 habitantes e capitais de Estado, de forma a maximizar a assistência a essa parcela da população. Tem como objetivos atender pessoas de todas as faixas etárias; proporcionar serviços de atenção contínua, com funcionamento 24h, incluindo feriados e fins de semana; e ofertar assistência a urgências e emergências, contando com leitos de observação.

Criação de CAPS no Município

O gestor, de acordo com a necessidade e demanda do seu município, encaminha projeto de implantação de CAPS para aprovação do Ministério da Saúde. Concedida a autorização pelo MS, é repassada parcela única de incentivo para a concretização do serviço, com critérios pré-definidos sobre sua aplicação, no artigo 2º da Portaria MS n. 245, de 17 de fevereiro de 2005[17] e, quanto ao CAPS AD III, no artigo 12 da Portaria MS n. 130, de 26 de janeiro de 2012[18].

Para iniciar o funcionamento dos Centros, o gestor municipal pode solicitar o incentivo antecipado do Ministério da Saúde, após um período de 2 ou 3 meses de atividades, contudo deverá encaminhar relatório sobre o funcionamento e o valor de manutenção da unidade, sendo este aprovado, passará a receber os repasses mensais de custeio, para pagamento de aluguel, pessoal, dentre outros.

Atenção em Urgência e Emergência

De acordo com a definição do Conselho Federal de Medicina (CFM), artigo 1º da Resolução n.º 1451/1995[19], pode-se classificar, Urgência como “a ocorrência imprevista de agravo à saúde com ou sem risco potencial de vida, cujo portador necessita de assistência médica imediata;” e Emergência como “a constatação médica de condições de agravo à saúde que impliquem em risco iminente de vida ou sofrimento intenso, exigindo, portanto, tratamento médico imediato.

Em casos de urgência e emergência, o atendimento é realizado através dos seguintes serviços:

a) Serviço pré-hospitalar móvel (SAMU): prestado através de atendimento móvel de Urgência, acionado pelo 192, em casos de urgências e emergências psiquiátricas/clínicas;

b) Serviços de saúde de urgência/emergência: atendimentos de urgência e emergência prestados em: hospitais com serviço de urgência/emergência; prontos-socorros; e unidades de Pronto Atendimento - UPA 24 horas.

Atenção hospitalar especializada

Engloba o serviço hospitalar de referência para atenção a pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades de saúde decorrentes do uso de drogas, as enfermarias especializadas em Hospital Geral e, excepcionalmente, os hospitais psiquiátricos especializados.

O serviço é direcionado a pacientes com transtornos mentais e/ou decorrentes do uso de drogas psicoativas, somente quando os recursos extra-hospitalares e de urgência/emergência se mostrarem insuficientes ao tratamento e apresentarem indicação médica de internação nestes leitos (conforme artigo 4º, da Lei n. 10.216/2001 – Lei da Reforma Psiquiátrica)[20].

Os leitos funcionam como suporte hospitalar para situações de urgência e emergência relacionadas a transtornos mentais e/ou decorrentes do uso indevido de drogas psicoativas, em situação de crise (tais como: transtornos com sintomas psicóticos agudos, síndrome de abstinência alcoólica, intoxicação aguda por drogas psicoativas), por curto período, visando à estabilização e/ou desintoxicação dos pacientes, até que tenham possibilidade de atendimento pelo CAPS ou outros serviços compatíveis. Os leitos são distribuídos em hospitais gerais e, excepcionalmente, em hospitais psiquiátricos.

Quando o atendimento for destinado a crianças e adolescentes, o ideal é que os leitos psiquiátricos estejam situados, preferencialmente, dentro das unidades de pediatria dos hospitais gerais, contudo, em caso de necessidade, devem ser acolhidos nos leitos disponíveis (mesmo que não existam no território leitos pediátricos), sendo garantido o direito a acompanhante (artigo 12, do ECA), em caso de internação, inclusive quando se tratar de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa.

O Ministério Público Estadual deve ser oficialmente comunicado das internações involuntárias logo após serem efetivadas, dentro do prazo de 72 horas, bem como das respectivas altas (8º, § 1º, da Lei n. 10.216/2001).

a) Enfermaria especializada em Hospital Geral

A enfermaria especializada em hospital geral funciona em caráter de internação, conforme avaliação e indicação médica, disponibilizando leitos exclusivos para tratamento de pacientes com transtornos mentais e/ou decorrentes do uso de drogas psicoativas.

Quando um hospital geral, disponibilizar mais de dez leitos relativos ao serviço hospitalar de referência para atendimento de pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades de saúde decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas, este deverá funcionar no âmbito de uma enfermaria especializada para pacientes com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades de saúde decorrentes do abuso de drogas psicoativas.

Conforme ressaltado anteriormente, quando se tratar de atendimento para crianças e adolescentes, o ideal é que as enfermarias e leitos psiquiátricos sejam situados preferencialmente dentro das unidades de pediatria dos hospitais gerais.

b) Serviço Hospitalar de Referência para atenção a pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades de saúde decorrentes do uso de drogas

Serviço que oferece suporte hospitalar para situações de urgência/emergência decorrentes do uso indevido ou abstinência de álcool, crack e outras drogas psicoativas, bem como de comorbidades psiquiátricas e/ou clínicas advindas da Rede de Atenção às Urgências, da Rede de Atenção Psicossocial e da Atenção Básica, funcionando em regime integral, durante 24 (vinte e quatro) horas, 7 (sete) dias por semana, inclusive feriados, sem interrupção da continuidade entre os turnos (2º, incisos IV e VI, da Portaria n. 148, de 31 de janeiro de 2012, do Ministério da Saúde)[21], que deve ser implantado em Hospitais Gerais, preferencialmente os de natureza pública ou filantrópica (artigo 8º, parágrafo único, Portaria n. 148, de 31 de janeiro de 2012, do Ministério da Saúde).

Nos hospitais gerais em que for implantado o Serviço Hospitalar de Referência, este deverá observar os seguintes parâmetros (artigo 6º, artigo 8º, parágrafo único, Portaria n. 148, de 31 de janeiro de 2012, do Ministério da Saúde):

I - no caso de até 10 (dez) leitos implantados, o Serviço Hospitalar de Referência para atenção a pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas poderá funcionar em:

a) leitos de clínica médica qualificados para o atendimento destinado a pessoas adultas em sofrimento ou transtorno mental e com necessidades de saúde decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas; ou

b) leitos de pediatria qualificados para o atendimento destinado a crianças e adolescentes em sofrimento ou transtorno mental e com necessidades de saúde decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas;

II - no caso de mais de 10 (dez) leitos implantados, o Serviço Hospitalar de Referência para atenção a pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas funcionará em enfermaria especializada destinada ao atendimento de pessoas em sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas.

Parágrafo único. Os leitos de atenção a pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas destinados ao atendimento de crianças e adolescentes deverão estar sempre localizados em espaço próprio, resguardando-se o direito à permanência de acompanhante em tempo integral.

Importante: via de regra, os Hospitais Gerais não possuem leitos suficientes para atendimento da demanda ou, não dispõe de ala reservada para internação de adolescentes, o que enseja atuação do promotor de justiça, tanto pelas via extrajudiciais ou judiciais a fim de que seja garantido o serviço.

c) Hospitais especializados

Ambientes especializados no tratamento de pacientes com transtornos mentais, em regime de internação, que após a Reforma Psiquiátrica, no Brasil, a tendência é a gradual redução dessa espécie de leitos. Conforme disciplina a Portaria do Ministério da Saúde n. 3.088/2011, em seu artigo 11, § 2º[22]:

O hospital psiquiátrico pode ser acionado para o cuidado das pessoas com transtorno mental nas regiões de saúde enquanto o processo de implantação e expansão da Rede de Atenção Psicossocial ainda não se apresenta suficiente, devendo estas regiões de saúde priorizar a expansão e qualificação dos pontos de atenção da Rede de Atenção Psicossocial para dar continuidade ao processo de substituição dos leitos em hospitais psiquiátricos.

Atenção Residencial de Caráter Transitório

a) Unidades de Acolhimento

São pontos de atendimento da Rede de Atenção Integral em Saúde Mental, que oferecem cuidados contínuos de saúde, com funcionamento 24 horas, em ambiente residencial, para pessoas com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, de ambos os sexos, que apresentem acentuada vulnerabilidade social e/ou familiar e demandem acompanhamento terapêutico e protetivo de caráter transitório cujo tempo de permanência é de até seis meses (artigo 9º, inciso I, da Portaria n. 3.088, de 23 de dezembro de 2011).

Quando se tratar de crianças e adolescentes, o atendimento será realizado em Unidade de Acolhimento Transitório Infantojuvenil, que disponibilizam acolhimento voluntário e cuidados contínuos pacientes com idade entre 10 (dez) e 18 (dezoito) anos incompletos, que apresentem problemas decorrentes do uso de drogas psicoativas, em situação de vulnerabilidade social e familiar e que demandem acompanhamento terapêutico e protetivo.

O serviço deverá funcionar de forma articulada com os demais serviços de atenção em saúde mental de crianças e adolescentes e receberá os encaminhamentos definidos exclusivamente pela equipe do CAPS, garantindo-se os direitos de moradia, educação, convivência familiar e comunitária aos pacientes, com funcionamento 24h e, de 10 (dez) vagas para atendimento.

Cada criança ou adolescente acolhido deve ter seu projeto terapêutico individualizado, com a participação do CAPS de referência, devendo conter as ações a serem desenvolvidas e o tempo de permanência na Unidade, cujo caráter residencial é transitório (Portaria n. 121, de 25 de janeiro de 2012 do Ministério da Saúde)[23].

Para implantar uma unidade de acolhimento, o gestor de saúde deverá encaminhar ao Ministério da Saúde os documentos disciplinados no artigo 12 da Portaria MS n. 121, de 25 de janeiro de 2012, bem como, o serviço poderá ser ofertado através de pactuações entre os Estados, Municípios e Distrito Federal, de forma local ou regionalizada, como unidade pública ou em parceria com instituições ou entidades sem fins lucrativos, atendidas as exigências estabelecidas na Portaria n. 121, de 25 de janeiro de 2012, do Ministério da Saúde.

b) Serviços de Atenção em Regime Residencial

São os serviços de saúde de atenção residencial transitória que oferecem cuidados para adultos com necessidades clínicas estáveis decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas (nos termos do artigo 1º, § 1º, da Portaria MS n. 131, de 26 de janeiro de 2012)[24].

A Portaria MS n.º 131, não estabelece Serviços de Atenção em Regime Residencial específicos para crianças e adolescentes, contudo, seria importante disponibilizar esses tipos de serviços específicos para o público infantojuvenil em razão das peculiaridades das fases da infância e adolescência.

c) Comunidades Terapêuticas

São inseridas no contexto de Serviços de Atenção em Regime Residencial, aplicando-se a elas todas as disposições da Portaria n. 131, de 26 de janeiro de 2012, do Ministério da Saúde.

As comunidades terapêuticas prestam serviço complementar, não integram necessariamente a rede pública de saúde, trata-se de atendimentos intermediários e de baixa complexidade, apresentando como principal instrumento a convivência entre os pares no processo de recuperação, propiciando resgate da cidadania, reabilitação física e psicológica e reinserção social.

Em regra, as comunidades terapêuticas são geridas por Organizações Não Governamentais (ONGs) e apresentam disponibilidade de vagas por meio de convênios com os municípios, contudo, cabe ao Ministério Público fiscalizar regularmente o funcionamento e a situação destes espaços, pois cada vez mais, estão sendo noticiados, tratamentos sem comprovação cientifica, desumanos e, até mesmo, a prática de tortura contra pacientes, o que deturpa a finalidade e deve ser passível de medidas imediatas pelo órgão do parquet.

Estratégias de desinstitucionalização

a) Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT)

São espaços localizados em áreas urbanas, visando atender as necessidades de moradia de pessoas com transtornos mentais graves egressas de hospitais psiquiátricos e/ou hospitais de custódia para tratamento psiquiátrico, que não possuem retaguarda familiar, bem como, indivíduos em situação de rua com transtornos mentais severos, que estejam inseridos em projetos terapêuticos com acompanhamento pelo CAPS.

Uma equipe profissional compatível às demandas e necessidades de cada uma das pessoas residentes deve ser disponibilizada nas residências terapêuticas, através de vínculo com a rede pública de saúde e acompanhamento multiprofissional do CAPS ou da Atenção Básica.

O procedimento para implantação do SRT está previsto na Portaria n. 3.090, de 23 de dezembro de 2011, do Ministério da Saúde[25], porém, não há referência expressa sobre residências terapêuticas especializadas no atendimento de adolescentes, contudo, pode ser uma solução adequada para adolescentes e jovens com acentuado nível de dependência, que necessitem de cuidadores em período integral e não tenham suporte familiar.

b) Programa de Volta para Casa

O presente serviço visa garantir assistência, acompanhamento e integração social para pessoas com transtornos mentais e histórico de internação psiquiátrica de longa duração, que necessitam de suporte específico e alta planejada, com reabilitação psicossocial assistida.

O benefício, regulado pela Lei n.º 10.708/2003[26], inclui o auxílio-reabilitação psicossocial, pago ao próprio beneficiário durante um ano, podendo ser renovado, caso necessário.

O serviço é destinado a pessoas com transtorno mental que tenham passado dois anos ou mais internadas, ininterruptamente, em instituições psiquiátricas, e que não apresentam situação clínica/social que justifique a permanência em internação hospitalar, e também aquelas que moram em Residência Terapêutica, ou as egressas de hospitais de custódia em tratamento psiquiátrico pelo mesmo período, conforme decisão judicial.

OS DEMAIS COMPONENTES

A) REABILITAÇÃO PSICOSSOCIAL: ações visando garantir ofertas de trabalho e renda, empreendimentos solidários e cooperativas sociais que contribuam para reinserção social e ampliação da autonomia dos pacientes.

B) PROGRAMA ACADEMIA DA SAÚDE: busca favorecer a saúde por meio de implantação e manutenção de polos com infraestrutura, equipamentos para prática de atividades físicas e de lazer, realizadas por profissionais apropriados da Atenção Básica em Saúde, especialmente pelos que atuam nos NASF, atuando de forma preventiva e, facilitando a reinserção social de pacientes com transtornos decorrentes do uso indevido de drogas.

C) CENTROS DE CONVIVÊNCIA: espaços de sociabilidade, produção e intervenção, na relação com a comunidade, a cidade e os aspectos culturais, para pessoas com transtornos mentais, visando a inclusão social.

D) PROGRAMA SAÚDE NA ESCOLA: é uma parceria entre os Ministérios da Saúde e da Educação, visando realizar ações de promoção da saúde, prevenção de agravos e atenção à saúde de alunos do ensino básico público, no espaço das escolas e das unidades básicas de saúde.

SUGESTÃO DE ATUAÇÃO PARA O PROMOTOR DE JUSTIÇA

Conforme amplamente demonstrado, a questão do abuso de substâncias psicotrópicas é uma realidade que cresce a cada dia entre o público infantojuvenil, demandando uma política pública especializada, com oferta de serviço eficientes pela rede pública de saúde mental para garantir a proteção integral asseguradas pelos diplomas normativos pátrios e internacionais.

Outrossim, são reiteradas as consultas a este Centro de Apoio Operacional, relacionadas a crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade em decorrência do abuso de álcool e outras drogas, sem que haja o suporte da rede local. Sendo assim, segue sugestões de atuação visando mobilizar a estruturação da rede, bem como, auxiliar na fiscalização dos serviços e na efetivação de direitos de crianças e adolescentes.

AÇÕES PARA MOBILIZAR A ESTRUTURAÇÃO DA REDE DE ATENÇÃO EM SAÚDE MENTAL INFANTOJUVENIL

- Requisitar ao gestor municipal informações acerca da estrutura existente em seu município de atuação para o atendimento a crianças e adolescentes em dependência de álcool e outras drogas, especificando os serviços e programas de educação, saúde e assistência social.

- Fiscalizar a implementação de Plano Municipal de diagnóstico, prevenção atendimento, encaminhamento e tratamento de crianças e adolescentes que abusam de substâncias psicoativas, com previsão de fluxo operacional de atendimento e encaminhamento interdisciplinar.

- Mobilizar campanhas educativas, preventivas, inclusive, entre a comunidade escolar, a fim de conscientizar a sociedade em geral, especialmente o público infantojuvenil quanto aos riscos e malefícios causados pelo uso de drogas.

- Cobrar do gestor municipal a implementação da rede de atenção básica, com todos os serviços necessários para atendimento de crianças e adolescentes em dependência de álcool ou outras drogas.

- Fiscalizar o funcionamento de serviços hospitalares de referência e enfermarias especializadas em Hospital Geral para a atenção integral de crianças e adolescentes em dependência de álcool e outras drogas, bem como a estruturação dos serviços de atenção em urgência e emergência.

- Mobilizar e fiscalizar a realização de convênios com entidades públicas ou particulares, a fim de complementar e garantir, o atendimento, tratamento e reabilitação de crianças ou adolescentes.

- Fiscalizar a disponibilidade orçamentária, assim como, a existência de propostas de leis, que possam assegurar recursos públicos necessários a implementação integral da rede de atenção integral em saúde mental.

- Acompanhar as ações do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Conselho Municipal de Políticas Públicas sobre Drogas, do Conselho Tutelar e das Secretarias Municipais de Educação, Saúde e Assistência Social, que visem garantir o atendimento de crianças e adolescentes em dependência de álcool e outras drogas no município.

- Firmar termo de ajustamento de conduta com o Poder Executivo Municipal a fim de garantir a regularidade dos programas e serviços relacionados com o tratamento de crianças e adolescentes com transtornos mentais em decorrência do abuso de substâncias psicoativas.

- Ajuizar Ação Civil Pública face do Município, quando esgotadas as possibilidades de tratativas extrajudiciais, visando adequar ou implementar o plano municipal de combate às drogas na infância e juventude, a rede de atenção integral em saúde mental específica para crianças e adolescentes em dependência de drogas e suas famílias, compreendendo a atenção básica em saúde mental, os centros de atenção psicossocial, atenção de urgência e emergência, dentre outros.

AÇÕES PARA GARANTIR DIREITO INDIVIDUAL DE CRIANÇAS OU ADOLESCENTES EM DEPENDÊNCIA DE DROGAS

- Realizar os encaminhamentos de crianças e adolescentes dependentes de álcool e outras drogas aos serviços de atenção básica da rede de atenção em saúde mental, aos serviços hospitalares ou extra-hospitalares, serviços de urgência e emergência, conforme as necessidades do caso concreto.

- Realizar os encaminhamentos aos serviços de assistência social e/ou ao Conselho Tutelar, para a aplicação das medidas de proteção e requisição dos serviços públicos necessários.

- Encaminhar os casos de urgência/ emergência relacionadas referentes ao uso de drogas por criança, adolescente ou adulto para o SAMU, Hospital, CAPS IlI, Posto de Saúde, Pronto-Socorro etc, requisitando a avaliação médica e/ou médica psiquiátrica.

- Mobilizar o gestor municipal para que disponibilize o serviço de SAMU para atender os casos de urgência/ emergência e, nos municípios que não estiver funcionando, que o atendimento seja realizado pelos profissionais de saúde da rede local.

- Recomendar ao Município e às Secretarias Municipais de Saúde, Educação e Assistência Social que os serviços necessários à garantir a recuperação, assistência, acompanhamento e reabilitação da criança ou adolescente dependentes de substâncias psicoativas.

- Instar ao Conselho Tutelar a aplicação de medidas protetivas previstas no artigo 101, do ECA, da Lei n. 8.069/1990 e, das medidas do 136, III, "b", visando assegurar a proteção integral para crianças/adolescente usuários de drogas.

AÇÕES JUDICIAIS VISANDO GARANTIR DIREITO INDIVIDUAL Á SAÚDE

Diante de casos concreto, de adolescentes comprometidos com uso abusivo de substâncias psicoativas, onde todas as medidas extrajudiciais cabíveis já tenham sido adotadas sem sucesso, caberá ao promotor de justiça:

- Colher informações da criança/ adolescente, e seus pais ou responsáveis legais, quando for o caso.

- Requisitar às Secretarias de Saúde, Educação e Assistência Social do Município a realização de avaliação médica, psicológica e social da criança/ adolescente dependente de drogas, em caráter de urgência, visando analisar se trata-se de hipótese de dependência química e, caso positivo, qual o tratamento adequado ao caso concreto; quais as medidas protetivas necessárias ao fortalecimento dos vínculos e o suporte familiar da criança ou do adolescente apresentando uso indevido de álcool ou outras drogas e quais ações necessárias a assegurar o exercício dos direitos fundamentais da criança ou adolescente, o convívio familiar e comunitário, a frequência à escola, a prática de esportes e lazer, dentre outros, que possam estar comprometidos em razão do uso de drogas.

A partir da avaliação médica, que deve ser individual e personalizada caso a caso, devem ser adotadas as seguintes medidas, prescritas conforme a necessidade do paciente:

CRIANÇA/ ADOLESCENTE SEM INDICAÇÃO DE INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA E COM SUPORTE FAMILIAR:

- Instar o Município (via recomendação, TAC e/ou ação civil pública de obrigação de fazer) a garantir o atendimento e o acompanhamento da criança/adolescente, de acordo com o caso concreto, nos serviços de atenção básica da rede de atenção em saúde mental (ESF, NASF, e.t.c) e/ou nos serviços extra-hospitalares especializados de atenção em saúde mental (CAPS i, CAPS AD, CAPS AD Il ou análogos), quando for necessário, seja o serviço prestado dentro da municipalidade ou de forma regionalizada, contudo, sempre com acompanhamento da família pelo CRAS ou CREAS.

- Encaminhar a criança/ adolescente ao Conselho Tutelar para aplicação das medidas protetivas do art. 101, do ECA, necessárias ao tratamento, assistência, reinclusão escolar, acompanhamento e reabilitação do paciente e sua família, sem prejuízo das medidas cabíveis para fazer cumprir suas requisições, a teor do disposto no artigo 136, III do ECA.

CRIANÇA/ ADOLESCENTE SEM INDICAÇÃO DE INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA E SEM SUPORTE FAMILIAR:

- Compelir o Município (via recomendação, TAC e/ou ação civil pública de obrigação de fazer) a viabilizar/custear o atendimento e o acompanhamento da criança/adolescente, nos serviços de atenção básica da rede de atenção em saúde mental (ESF, NASF, Consultório na Rua, dentre outros) e/ou nos serviços extra-hospitalares especializados de atenção em saúde mental (CAPSi, CAPS AD, CAPS AD Ili ou equivalentes) e, quando for o caso, providenciar seu encaminhamento, via CAPS, à unidade de acolhimento transitório infantojuvenil ou serviço equivalente, localizados na municipalidade ou, conforme a pactuação existente, com acompanhamento da família pelo CRAS ou CREAS.

- Em caso de omissão dos pais ou responsável legal e, esgotadas as possibilidades de reinserção familiar, propor ação judicial a fim de realizar o afastamento do convívio familiar da criança/ adolescente em situação de vulnerabilidade, tanto pelo uso de drogas, quanto pela falta de retaguarda familiar (artigo 101, § 2° do ECA), cumulada com a aplicação de medida protetiva de acolhimento institucional ou familiar (artigo 101, VII e VIII, do ECA).

- Encaminhar a criança/ adolescente ao Conselho Tutelar para aplicação das medidas protetivas do art. 101, do ECA, necessárias ao tratamento, assistência, reinclusão escolar, acompanhamento e reabilitação do paciente e sua família, sem prejuízo das medidas cabíveis para fazer cumprir suas requisições, a teor do disposto no artigo 136, III do Estatuto da Criança e do Adolescente.

- Requisitar à autoridade policial, a instauração de procedimento investigatório para apurar a ocorrência dos crimes previstos nos artigos 244 (abandono material) 246 (abandono intelectual) ou 247, do Código Penal, em desfavor dos pais ou responsável legal, quando houver indícios.

CRIANÇA/ADOLESCENTE COM INDICAÇÃO DE INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA:

- Quando houver indicação médica de internação ou tratamento ambulatorial, de criança/ adolescente dependentes de drogas, esgotadas as medidas extrajudiciais, sem o atendimento necessário tenha sido prestado, caberá ao Promotor de Justiça requerer, judicialmente, que seja garantido o serviço, naquele caso concreto, com todas as medidas que se fizerem necessárias, nos moldes do artigo 101, incisos V e VI do ECA.

- Instar o município a garantir o serviço de internação médica ou médica psiquiátrica quando não for disponibilizado pelo Poder Público, em outro município, conforme a necessidade do caso concreto, bem como promover a devida responsabilização do gestor público pela omissão no atendimento.

Quando a Rede está fortalecida, os serviços são ofertados de forma eficiente, a dependência química pode ser contornada, acompanhada e superada pelo paciente, apesar de exigir um tratamento constante, é possível ter êxito, conforme podemos demonstrar no relato de superação do Dr. Nelcy Colares, psicólogo especialista em dependência química, servidor do Tribunal de Justiça do Estado como analista judiciário, perito em psicologia, proprietário de uma clínica de psicologia.

Dr. Nelcy Colares

Tribunal de Justiça do Estado

“Nem sempre foi assim. Eu comecei a usar álcool aos 10 (dez) anos de idade, aos 11 (onze) anos passei a consumir também outras drogas como inalantes, solventes, loló, lança-perfume. E isso gera reflexo de questões psicológicas minhas, embora eu venha de uma família abastada onde não havia registros de sofrer violências físicas, somente uma palmada ou outra de pai e mãe que era comum na época, mas nada grave.

Eu sempre tive uma personalidade muito impulsiva, inclusive inclinada a violência, e isso foi se somando né… um rapaz, um jovem rico, mimado, e que foi conhecendo e entrando nas drogas.

Aos 15 (quinze) anos eu tive a minha primeira experiência com maconha, me identifiquei muito, me tornei um adicto àquela droga, chegava a viajar para ir comprar na plantação, comprava as vezes 500g, 1kg, até 2kg de maconha já cheguei a comprar junto com alguns amigos.

Aos 16 (dezesseis) anos, conheci a cocaína, e passei a usar muito, a cada dia mais! Não me reconhecia como dependente.

Eram outros tempos e naquela época, com 15 (quinze) anos meu pai me deu um carro, e esse carro já pude vender e começar um negócio, e desse negócio eu logo tive parte de uma revenda. Eu cheirei toda a minha revenda, acabei com tudo que eu tinha. Mas, para a minha sorte, minha esposa, na época minha namorada, engravidou, e aquilo mexeu comigo, mudou minha cabeça e eu decidi parar de usar e buscar um tratamento.

Dos 18 (dezoito) aos 21 (vinte e um) anos foram muitas tentativas, ficando sóbrio em alguns momentos e recaindo em outros. Mas, após faze acompanhamento no CAPS, passar por psiquiatras, psicólogos, eu pedi para ser internado em uma comunidade terapêutica, consegui parar de usar e já fazem 26 (vinte e seis) anos.

Nessa caminhada que também não foi fácil, mas muito mais repleta de alegrias, eu pude voltar a estudar e deixar de ser aquele cara que não tinha nem o primeiro grau completo. Em um ano eu fiz o primeiro grau, o segundo grau através do supletivo, entrei para a faculdade de psicologia e fiz uma pós-graduação na PUC de Minas Gerais, seguida de outra na mesma universidade, e continuo com os estudos até hoje.

Hoje, com muita alegria, com muita felicidade, além da família linda que eu tenho, minha esposa e três filhos, tenho colecionado oportunidades de trabalhar pelas pessoas, de cuidar das pessoas. Já fui gerente de CAPS, psicólogo do Hospital de Clínicas na área da psiquiatria, Coordenador Estadual de Saúde Mental, Presidente de Conselho Municipal, Conselheiro Estadual e construí uma carreira firme, onde a principal meta é essa, cuidar das pessoas.

E como Padre Aroldo, que foi um dos fundadores da Fazenda do Senhor Jesus onde eu estive, e fundador da primeira Comunidade Terapêutica no Brasil, eu fui aprendendo a viver com medo de nada, só amor!Hoje, sou psicólogo, trabalho ajudando outras pessoas e famílias que tem problemas com álcool e outras drogas a saírem da dependência química que afeta muitas vidas, sou Coordenador Voluntário no Estado do Pará da Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas, e também como voluntário já fui presidente e vice-presidente do Conselho Municipal de Entorpecentes.

A minha grande alegria é saber que, com o meu trabalho, eu consigo ajudar uma mãe a deixar de chorar porque o filho está nas drogas, um pai a deixar de sofrer porque o filho, ou a filha, ou a pessoa que ama está entregue às drogas. E um ser humano poder sair da dependência química, deixar de ser aquilo que ele se tornou, recuperar a humanidade e a dignidade que ele perdeu para ter uma vida limpa e serena”.

CONCLUSÃO

O problema decorrente do abuso de substâncias psicoativas por crianças e adolescentes é recorrente em todo Estado do Pará, razão pela qual, faz-se necessário que sejam envidados esforços no sentido do fortalecimento de toda a Rede de Proteção, no aparelhamento dos municípios a fim de que seja prestado o tratamento adequado e eficaz às demandas existentes, bem como, do acompanhamento pelo Sistema de Justiça, no que se refere, à efetivação de direitos, quando as vias extrajudiciais forem esgotadas sem êxito.

É importante, que sejam implementadas políticas públicas preventivas, educativas, que tenham como meta, informar sobre os malefícios da droga, bem como, as consequências decorrentes do abuso, conforme art. art. 227, § 3º, VII, da CF/88 “VII - programas de prevenção e atendimento especializado à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de entorpecentes e drogas afins”.

Cumpre destacar, outrossim, que constantemente o Ministério Público é acionado por pais e responsáveis, atrás de solução para seus filhos, esperando que o promotor cumpra com o papel, que em verdade, é deles, de orientação, imposição de limites. Não cabe ao membro do Ministério Público ocupar o papel dos pais e responsáveis na criação de seus filhos, desta forma, por mais difícil que seja o caso concreto, não podem os familiares, eximir-se de suas responsabilidades.

Conforme amplamente exposto, não cabe apenas ao Estado o dever de atuar na prevenção e no tratamento de crianças e adolescentes usuárias de substâncias psicoativas, mas também, aos pais e responsáveis que detém o dever de guarda e proteção. Conforme art. 22 do Eca:

Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.

Diante dessas situações, caberá ao promotor de justiça, primeiramente, atuar como indutor do poder público para que crie programas e políticas direcionadas ao combate e tratamento prioritário de crianças e adolescentes usuárias de álcool e outras drogas, bem como, cobrar dos gestores o efetivo funcionamento das estruturas. Requerer e acompanhar a implementação do plano de atendimento de jovens envolvidos com álcool e drogas, possibilitando o tratamento ambulatorial de desdrogadição em sua comarca de atuação, tendo em vista que, conforme citado anteriormente, a maioria dos municípios não contam com a estrutura e o suporte necessário, seja para prevenção, seja para o tratamento.

Com a Rede de Proteção, caberá ao promotor de justiça extrajudicialmente mobilizar seu fortalecimento, visando assegurar o atendimento adequado e efetivo. Com os pais, deverá instar o Conselho Tutelar para que aplique e acompanhe as medidas protetivas do art. 101 e 129, do ECA, visando o fortalecimento dos vínculos familiares, bem como, da necessidade de conscientização sobre o seu papel na vida daquela criança/adolescente, assim de sua responsabilidade por seus atos. Art. 129, do Eca:

Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável:

I - encaminhamento a serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família;

II - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;

IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;

V - obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua freqüência e aproveitamento escolar;

VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado;

VII - advertência;

VIII - perda da guarda;

IX - destituição da tutela;

X - suspensão ou destituição do poder familiar .

Os pais e responsáveis tem o dever de acompanhar o tratamento de seus filhos durante o período de desdrogadição, bem como o direito de serem inseridos em programas e serviços de apoio a família e orientação à família. Art. 100, Eca:

Art. 100. Na aplicação das medidas levar-se-ão em conta as necessidades pedagógicas, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.

Parágrafo único. São também princípios que regem a aplicação das medidas:

IX - responsabilidade parental: a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais assumam os seus deveres para com a criança e o adolescente;

Desta forma, sendo observado pelo promotor de justiça, no caso concreto, que uma criança/adolescente encontra-se em situação de risco, em decorrência do uso abusivo de substância psocoativas, deverá realizar os encaminhamentos necessários ao atendimento pela rede do município, via de regra, de forma ambulatorial, através dos Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD) e, em casos excepcionais, o acolhimento integral, mediante internação para desintoxicação ou outros cuidados de saúde, por curto espaço de tempo.

Em casos extremos e devidamente comprovados, em que há consumo excessivo e elevado grau de comprometimento, que possa inclusive, atentar contra a vida da criança/adolescente, bem como, recusa do mesmo em aceitar e cumprir o tratamento, poderá ser requerida a internação compulsória, cujo pedido deverá estar amparado em laudo médico, comprovando a necessidade deste tipo de tratamento.

Atualmente, no Estado do Pará, a política pública é efetuada através dos CREAS e CAPS, não havendo clínicas públicas destinadas ao tratamento de pessoas usuárias de substâncias psicoativas, principalmente, destinadas ao público infantojuvenil. O Hospital das Clínicas faz esse atendimento em casos de surtos psicóticos, por um lapso temporal curto, via de regra de 15 (quinze) dias, destinados a retirar o paciente daquela situação emergencial e não, ao tratamento continuado.

Em situações graves, em que o município não ofereça o serviço adequado para o tratamento, alguns promotores requerem a internação compulsória do adolescente em clínicas particulares, custeadas pelo município, contudo, essa não é a diretriz nacional, nem a regra. Tal medida é adotada em caso extremo. O objetivo deve ser sempre a estruturação da rede pública.

Quanto as comunidades terapêuticas, em sua grande maioria, não tem perfil para receber adolescentes, bem como, é reiteradamente divulgada na mídia, situação de violação de direito como maus-tratos, tortura nos paciente e ausência de corpo técnico necessário para deselvolver o atendimento.

É nítido, que existe uma grande deficiência do Estado do Pará na implementação das políticas públicas e dos programas de atenção aos dependentes químicos, principalmente, no que se refere ao atendimento especializado a crianças e adolescentes, desta forma, diante do caso concreto, cabe ao membro do parquet adotar todas as medidas cabíveis para possibilitar a recuperação de dessa pessoa em formação envolvida com substâncias psicoativas, bem como, articular junto ao município o fortalecimento da Rede de Atendimento, visando garantir tratamento adequado no município.

 

Fonte: Ministério Público do Estado do Pará (MPPA)